08/03/2009

gelado #236


E eu a pensar que duraria um bocadinho mais; afinal a iconografia consta de uns escassos três, quatro segundos. Bom, adiante. O segredo está na entoação, entre o sarcasmo resignado, primeiro, e o pânico da dúvida existencial, depois: a narração de Tom Ewell, voraz e demonstrativa como poucas vezes aconteceu, escapa às tormentas da insuportável verborreia explicativa e torna-se miraculosamente numa obra-prima do cinismo e da insegurança do macho, a contas com uma intromissão na sua regrada vidinha. A América urbana nos anos cinquenta, com os seus lares arrumadinhos e a televisão santa padroeira, numa artificiosa recriação de estúdio, a estalar de corres berrantes e de kitsch, desde as vestimentas de Monroe ao décor da casa de Ewell. No último Ípsilon, Jorge Silva Melo afirma que gosto da crueldade e do Billy Wilder. Mas o Billy Wilder não despreza as personagens; neste filme, depois de todos os fantasmas quase masoquistas projectados pela personagem de Ewell, assiste-se à reconciliação do espírito: o triunfo do conservadorismo e do lema um lar, uma família. Felizmente, isto não é do Adrian Lyne.

gelado #235


Espanta-me um argumento usado contra o último Allen: a atracção pelos locais turísticos e "belos" e o desprezo pelo "sujo" quotidiano. Andamos a dormir? É que tendo em conta como Nova Iorque foi retratada por Woody ao longo de mais de duas décadas, não deixam de ser estranhas estas implicações com a burguesia e o seu mundinho purificado. O bas fond e o degredo catalão que fiquem para outros. Quando o homem, por entre três clarinetadas no Casino Estoril, vier realizar um filme em Lisboa, as queixas terão este rumo: cadê o Bairro do Relógio? Cadê as porcas calçadas e os copos de tinto a partirem-se contra uma parede na madrugada do Bairro? Cadê restaurantes de fado com homens à navalhada? Cadê o Estádio da Luz?

gelado #234


Dia Internacional. Saudações.

gelado #233


[...]. Uma das medidas em negociação teve origem em França e passa pela suspensão do acesso à Net por parte dos ISP. Assim sendo, os piratas não são levados a tribunal, mas antes avisados pelos operadores de Internet. No caso de continuarem com as acções ilegais o acesso à Internet é suspenso. Ontem, no jornal do Marcelino.

Providencio ao Bom Senhor para que me chegue o aviso de que os preços dos dvds e dos cds tiveram uma redução na ordem dos 75%. É que o dinheiro não abunda, e entre batatas, couves, toucinhos do céu, tabaco, pescada, bacalhau, mayoneses ou dvds e cds a mais de vinte euros, a dificuldade de escolha nem se coloca. O The Long Day Closes, do Terence Davies, já vai a 73.3%. Espero ansiosamente pelo aviso de download completo. O corsário segue tranquilamente o seu rumo.

gelado #232

1) Estamos "perante um quadro axiológico da honra deturpado". Justificação do deputado José Eduardo Martins por ter mandado pó caralho o deputado Afonso Candal. Ainda: o ridículo "vai para o c......" presente nos jornais prende-se com o facto de, também neste caso, as criancinhas poderem dar uma vista de olhos pelo jornal do papá ou da mamã? Pó caralho. Já dizia a Katherine Hepburn: os executivos de Hollywood dizem imbecilidades e alarvidades a todo o momento, mas proíbem que se diga um simples merda num filme. Pó caralho.

2) Quatro indivíduos de uma cor que eu não vou referir, para não beliscar as consciências da pandilha do multiculturalismo, roubaram alguém meu conhecido. Como são meliantes do nosso tempo, ignoraram os cinquenta euros na carteira e levaram o actual ópio do povo, vulgo telemóvel. É a era das tecnologias, está claro.

3) Mas para que caralho serve o twitter?

04/03/2009

gelado #231


Depois de uma brilhante carreira dedicada aos filmes "mudos", o portista Aki Kaurismaki decidiu mesmo realizar um filme mudo, baseado no conto finlandês Juha, e com a participação de alguns dos seus actores de sempre, como Kati Outinen ou Sakari Kuosmanen, a mesma dupla de Nuvens Passageiras. Uma espécie de Sunrise em que é a mulher campesina a ser levada pelo urbano canto da sereia, tem a simplicidade dos arquétipos e o habitual humor anti-histérico do cineasta, mas, desgraçadamente, possui uma sinfonia rock intrusiva como acompanhamento e não está sequer a cerca de vinte e sete mil milhas marítimas dos seus melhores trabalhos. Isto parece-me chuva no molhado, pois as personagens, a montagem e os décors de Kaurismaki já são regados a quietude e impassibilidade, sem que para tal tenha de existir a ajuda da muleta do mudo, numa tentativa forçadíssima de impor uma ideia que já tínhamos percebido muito tempo antes. E, mesmo com a atenuante do "mudo", nunca Aki foi tão genérico e óbvio na sua dramaturgia. Mil vezes só o concerto das máquinas dos fósforos no genérico de The Match Factory Girl. Deve estar no norte, a beber vinhaça.

gelado #230

"…on the subject of the beauty or ugliness of compositions, I'd like to point out that "beauty" and "realism" are opposed concepts, that they will always be defined by their relationship to each other. Realism is always relative to prevailing practices, and the energy and newness that it aspires to, the ability to revivify the mystery of the photographic image, is totally dependent upon tearing down or neglecting or violating something that we've come to expect. When Rossellini or de Toth decided to let the camera shake, they were a) consciously or unconsciously evoking the newsreel footage that came out of WWII; and b) inviting criticism for undermining the beauty of the composed image. Ditto Cassavetes finding inspiration in cutting that evoked the tension of live TV when the control room punches up the wrong camera for a second; ditto Kubrick shining lights at the camera as if he were a street photographer unable to control light sources; ditto countless other attempts to make the image seem alive again. In each case something nice-looking was destroyed; in each case a new generation of filmgoers learned to find the innovation nice-looking."

E depois apareceu a MTV.

gelado #229


Os anos oitenta foram de facto maravilhosos. Depois veio o Cobain e fodeu com aquilo tudo. Inclusive com o Frágil, quando eles iam ao cu uns aos outros com a porta da casa de banho entreaberta, "para serem vistos". Pena.

gelado #228

1) Como tenho cada vez menos paciência para dar um (que ao fim do dia podem ser vários) cigarro aos cravas profissionais, comecei a andar com dois maços nas calças: um deles está vazio.

2) O que é a Mulher? O que foi o Big Bang? Haverá vida extraterrestre? Os dinossauros foram mortos por um meteorito? Será possível viajar no tempo? O que leva alguém a tornar-se adepto do Benfica? Tudo perguntas que a humanidade já faz há imenso tempo, aguçada pela sua natural curiosidade. A este conjunto de questões intemporais, pode-se acrescentar uma outra: por que razão o canal Hollywood, no último ano, passou cerca de cinquenta vezes o filme Godzilla, de Roland Emmerich?

3) Inanidades có(s)micas no cinema2000. Rodolfo Castro. "The Reader" é uma extraordinária película que prima pela profundidade ao invés da habitual dinâmica narrativa.

01/03/2009

gelado #227

Apesar da medíocre exibição e de um resultado assim-assim, nem tudo foi mau para o FCP no dia de ontem. Ganhámos a quinta (em seis possíveis) Taça BES, troféu patrocinado em conjunto pela instituição bancária e pelo pravda vermelho -passe o pleonasmo-, e que coroa a melhor equipa nos duelos entre o FCP e outras duas agremiações ao longo da Liga. É pouco, é inútil, é indiferente? Sim, mas é uma forma de habituação caso se concretize a possível vinda de Paulo Bento na próxima temporada. Campeonatos e Ligas dos Campeões para o raio que os parta; Supertaças, Taças do álcool, Taças bancárias, isso sim, tudo papado. As Oliveirenses, os Cinfães, os Benficas, os Marrazes, e os Sarzodelos que se preparem: escondam-se, tremam, fujam. Aproxima-se um massacre do FCP em competições anémicas e com a importância de uma unha de gel. E após quatro anos de Bento, diremos: excelente.
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