Bom ano.
31/12/2009
"da década.".
Ora vamos lá.
Uma das coisas divertidas de ler no patusco Rosenbaum surgia no final de cada ano, quando ele expressava basicamente o seguinte: estes bandalhos destes críticos mainstream, pá, que só debitam listas de best of de cada ano como publicidade camuflada aos produtos das majors, pá, e que 'tão todos metidos na cartelização Grandes Companhias/ Academia, pá, uma vergonha. Pá. E depois de exclamar a sua indignação para com os bandalhos, o Jonathan escrevia... uma lista. Enquadrava-se no negócio das listagens a velha máxima de Saint Godard, de que para se criticar um filme o melhor era fazer um. A verdade é que ninguém gosta de fazer listas. Ninguém mesmo. Mas no final de cada ano (nalguns casos mais extremos ao fim de quinze dias), lá estão elas a empastar papel (só à ocupação das listas de fim de ano em cada jornal ou revista deve equivaler-se a quantidade de 500 mil toneladas de madeira) ou a preencher centenas de milhar de tetra-gigas. É como aquela piada no The Shawshank Redemption (o melhor filme de sempre, para o Dr. Luís Filipe Menezes): aqui somos todos inocentes. Rais' parta as listas. Bandalhos!
O segundo mais importante acontecimento da década está logo na primeira imagem. Bendito Bela Guttman. O meu filme da década é o They Live!, realizado em 1988, e que seguramente ocupará a mesma posição no final de 2019, isto no caso de eu não me tornar "crítico" da Time Out. O meu filme de 2009 é o City Girl, do Murnau, que me fez chorar como eu não me lembrava (embora em sentido inverso) desde aquela ocasião em que no circo um palhaço se aproximou de mim. O meu outro filme de 2009 é o Gran Torino, ou a classe que é abrir uma lata de cerveja e sorver a espuma. Disco da década é o Amnesiac, dos Radiohead, embora estivesse na dúvida se não haveria de colocar um do Bob Dylan, apesar de nunca ter ouvido uma canção completa do senhor. Livro da década, escrito no ano em que a minha avó nasceu, é o The Sound and the Fury, lido nas gélidas noites invernais de 2002 e que me aguçou para sempre a ideia de no final da vida ir viver para os lamaçais e putedo sulistas. Gaja da década a Ludovigne Sagnier no Swimming Pool. Acho que tem a ver com o facto de eu naquela altura andar com uma outra gaja parecidíssima com ela. Até as mamas são parecidas (pelo menos naquela altura eram). Jogador da década, Messi, que só não classifico de melhor jogador desde a tomada de Bastilha porque não era vivo quando o Cubillas jogava. Também ponderei a hipótese Derlei 2002/2004. Site da década, a milhas de distância de qualquer outro, o já por aqui referido GGG, aí exemplificado com uma foto da extraodinária Annette Schwartz, em cujo último vídeo que vi era esporrada na cara num pinhal e depois caminhava até a um campus universitário ainda com a esporra a pingar do olho. O programa televisivo da década são as duas primeiras séries dos Gato Fedorento, na Sic Radical, bem antes de se tornarem nos bobos da corte do actual regime. O emule foi uma benção, permitindo-me ver muita coisa que dificilmente poderia visionar noutro lado e impedindo-me de gastar euros para encher o bandulho dos senhores dvd. Ai os extras, ai Minha Mãe, olha ali aquela cena em que se vê o Tim Burton a comer uma maça com caroço. Algum comentador Vasconcelos, algum cineasta Valente, algum Jorge Paixão da Costa é capaz de fazer o obséquio de contratar os meus serviços? É que foi também nesta década que me tornei um expert em Adobe Premiere e Avid. Com toda a humildade, posso afirmar que sei fazer uma coisa que, por exemplo, o Baz Lurhmann não sabe: ligar dois planos. Foi já com vinte e dois anos que comecei a fumar, e depois daquela exaustiva greve de três horas em 2006 cheguei à conclusão de que quem me tira um Chesterfield tira-me o...oxigénio. Perceberam? Cigarros..oxigénio? Sim? Vocês também são todos uns bandalhos. Desde 2004 ou 2005 que religiosamente bebo sempre duas cervejas por dia. No mínimo. Nunca fiquei bêbado. E aquele jantar num snack bar da Rua da Misericórdia provou-me, se havia dúvidas, de que os jaquinzinhos são o melhor petisco de sempre. Bandalhos.
De 2009,
1. Gran Torino
2. The Hurt Locker
3. Inglorious Basterds
4. La Mujer sin Cabeza
5. L' Heure d'été
6. Public Enemies
7. Two Lovers
8. Les Plages d' Agnès
9. Singularidades de uma Rapariga Loira
10. Che, part one
"da década" (com bónus de mais trinta e com arrumação apenas instintiva),
Takeshi's, Kitano
Still Life, Zhang Ke
Sin City, Rodriguez
Catch Me if you can, Spielberg
Vai e Vem, Monteiro
Gran Torino, Eastwood
Elephant, Van Sant
La Ciénaga, Martel
Cars, Lasseter
Hundstage, Seidl
There Will Be Blood, Anderson
Million Dollar Baby, Eastwood
Iklimer, Ceylan
In The Mood For Love, Kar Wai (só à terceira)
Zodiac, Fincher
The Host, Bong-ho
Onde Jaz o teu Sorriso?, Costa
Juventude em Marcha, Costa
Los Muertos, Alonso (não sei nem quero saber se é o que mais gostei de ver, mas sei que era o que eu mais gostaria de ter realizado)
Fantasma, AlonsoMinority Report, Spielberg
A History of Violence, Cronenberg
S-21, Pahn
De l'autre côté, Akerman
Mulholland Drive, Lynch
Royal Tenenbaums, Anderson
Mysterious object at noon, Apichatpong
Before Sunset, Linklater
ABC Africa, Kiarostami
Noite Escura, Canijo
Les Glaneurs et la Glaneuse, Varda
The New World, Malick
Femme Fatale, de Palma
Mission To Mars, de Palma
Rapace, Nicolau
YI YI, Yang
Russian Ark, Sokurov
L' Anglaise et Le Duc, Rohmer
Be With Me, Khoo
Visitor Q, Miike
Megliu Giuventù, Giordana
Crimson Gold, Panahi
25th Hour, Lee
Team America, Parker
Stanza del Figlio, Moretti
Kill Bill 2, Tarantino
Ali, Mann
Va Savoir, Rivette
Caché, Haneke (ninguém é perfeito)
Le Voyage du ballon Rouge, Hou
En La Ciudad de Sylvia, Guerin (quando for grande também quero fazer disto. Ou montar. Tenho um diploma).
O Delfim, LopesWe own the Night, Gray
The Hurt Locker, Bigelow
Election 2, To
Gomorra, Garrone
Anges Exterminateurs, Brisseau
Vou Para Casa, Oliveira
The Big Red One: The Reconstruction, Fuller.
They Live!, Carpenter.
Esqueci-me de mais uns trezentos e vinte (dos quais não faz parte o Lost in Translation).
29/12/2009
o cachimbo.
Não ter ido ao cinema ver Inglorious Basterds foi uma das decisões acertadas de 2009. Aliás, não ter ido muito ao cinema, em 2009, constituiu-se como uma escolha acertadíssima. Os meus cada vez mais baixos índices de tolerância para com telemóveis coloridos, gargalhadas alarves fora de contexto, sussurros incomodativos e pipocas barulhentas superam em larga escala a "magia da tela", que mesmo assim ainda lá vai resistindo aos golpes alheios, como na projecção do Public Enemies, em que uma mulher, em vez de estar a realizar tarefas construtivas, como lavar o chão de casa, fazer cachecóis para os sobrinhos ou lavar a louça, preferiu desperdiçar o seu tempo e a minha paciência a mexer com esmero nas chaves do carro ou da casa. E depois admiram-se que existam assassínios em massa. Por tudo isto, contribuo cada vez mais para as economias da pirataria, ora sacando filmes ora comprando cópias em óptimo estado ao meu cigano de confiança. Perdem-se a "magia da tela" e a "pureza" da cinefilia, mas ganha-se sossego e concentração, até porque não estou a ficar mais novo. Já referi a "magia da tela"? Ah sim, vejo que já. E agora, a insídia. Foi a ver aquele diálogo entre o De Niro e o Pesci, no Raging Bull, em que o primeiro tece uma teia à volta do segundo para perceber se este tinha ou não fodido a sua mulher, que eu dei por mim a pensar "epá, isto do cinema é capaz de ser fixe". A arte da insídia, da tortura psicológica, do verbo e dos gestos como armas estratégicas para se obter o que se pretende, é uma das grandes alavancas dramáticas que um filme pode ter, e a técnica primordial para o efeito desejado é ter a câmara o mais repousada possível, só a movendo ligeiramente no caso imprescindível de ter que se revelar elementos essenciais à sequência, como por exemplo uns judeus escondidos numa cave. Os trejeitos afectados de Christoph Waltz nos primeiros vinte minutos de Inglorious Basterds (ou mais tarde, na cena do strudel, em que como bónus se ensina aos clientes do Eleven de como se deve comer), uma afabilidade que aterroriza devido ao conhecimento que o espectador tem daquela farda, e que conjugada com a minúcia burocrática com que dispõe papéis e molha a caneta no tinteiro, torna toda a sequência um exemplar quase-perfeito na grandiosa arte da insídia. E o momento em que apresenta o seu fantasioso cachimbo é a mais singular demonstração de Poder de que me lembro em pelo menos uma semana. Ora, toda esta tensão construída à base do esqueleto da palavra (implacável, a milhas da pífia e insuportável verborreia das galinhas da segunda parte do Death Proof), da expressão corporal e do SOM requer silêncio, recato e ambiente de mosteiro. Duvido, portanto, que face à luta efectuada por uma horda de pitas, pitos e de enfastiados casais de classe média , a "magia da tela" conseguisse prevalecer com toda a sua "força". Gosto tanto da expressão "a magia da tela"; melhor só mesmo "a magia do cinema".
24/12/2009
18/12/2009
alegoria da caverna.
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