Segundo os cânones em prática, há que captar "imagens telegénicas", reter o extraodinário e não o corrente. O ordinário é a paz, o extraodinário é o escândalo e o conflito violento. Mas com a acumulação do extraodinário nos ecrãs e na imprensa (notícia é o homem morder o cão e não o cão morder o homem), a relação inverte-se: a acção violenta e o conflito tornam-se no comum e a ordem pacífica fica de fora. Parece como se "o mundo" fosse composto unicamente por actos violentos. A informação e o entretenimento, ou a "indústria" da tensão", como lhe chama Hermann Broch, difundem e impõem a validade mundial da violência. Vicente Romano, A Formação da Mentalidade Submissa, Deriva.
Agora que o nosso país, a crer na "objectividade" jornalística do último mês, está transformado num antro de perfídia e violência que transforma a Detroit de Robocop num jardim escola, torna-se (in)útil sugerir que o toque final na total propagação do medo e da inseguração no cidadão seria um "telegénico" assalto à redacção jornalística de uma televisão no momento do noticiário nocturno, com o pivot, de preferência, a servir de refém. Todos ficariam contentes: os gatunos a contracto receberiam uma boa quantia para finalmente pagarem aquelas férias na Rep. Dominicana que as suas esposas há tanto almejam; o canal televisivo rebentaria audiências, e o pivot, em particular, permaneceria como um mártir até ao final dos seus dias; e por fim, mas não menos importante, o cidadão confirmaria os seus presságios e sentimentos de caos e desordem, reclamando a presença de trinta salazares em cada esquina, uns empilhados por cima dos outros. O medo é um negócio ainda mais vantajoso do que se possa pensar. É aproveitar.