13/10/2008

gelado #111

Do nada viemos, para o nada voltamos.

Tornou-se oportuno visionar recentemente De l' autre côté, em face do tópico "emigração/imigração" que tem poluído a tinta de jornal e a paisagem audiovisual portuguesa, com o contributo de imparáveis figuras como o mestre de submarinos Paulo Portas, aquele gajo do PNR, ou mesmo o Cardeal Pacheco, que no seu terror ao hediondo politicamente correcto criticou Sá Fernandes por ter retirado de Entre-Campos o bonito cartaz do gajo do PNR, uma autêntica afronta à liberdade de expressão de indivíduos que pugnam pela felicidade alheia. De l' autre Côte, então, documentário da belga Chantal Akerman, autora de um magistral filme-maratona, Jeanne Dielman, 23 Quai du Commerce, 1080 Bruxelles, que a passar num multiplexe levaria não só o público a zarpar da sala como também as cadeiras e o ar condicionado fugiriam dali em pânico. Neste seu trabalho, Akerman aborda a passagem ilegal dos mexicanos para o outro lado, em particular para o Arizona, entrevistando familiares de jovens que sucumbiram às balas enquanto tentavam o american dream, homens que quase conseguiram mas viram-se forçados a voltar, sempre com a preocupação de não se vergar a qualquer nódoa sensacionalista, evitando planos aproximados de rostos magoados e ignorando a soporífera música dos coitadinhos. Por vezes, a cineasta coloca a câmara próximo de um muro ou vedação a separar os dois países, filmando o outro lado, o das oportunidades, encarnando o estado de alma de quem vê ali a salvação mirífica mas inantigível. Há um plano sequência que se inicia junto a uma dessas vedações, passa pelo fluxo rodoviário num posto fronteiriço, e termina na fantasmagoria de uma aldeia mexicana; silêncio-barulho-silêncio, tudo num único plano, impressionante. Chantal não se coíbe de filmar a poeira, as ventanias, e a natureza em bruto da paisagem mexicana, talvez tentando encontrar aí as razões para a fuga para a derrota. Escapando à unidimensionalidade, dá voz, na segunda parte, ás gentes americanas, os famosos rednecks, que se mostram receosos das "doenças" que "eles" possam trazer e de que eles "tomem conta disto tudo". Cada um com as suas razões. Só digo isto: prefiro, na generalidade, um (a) brasileiro (a) a atender-me num café do que um português.
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