A minha capacidade de observação nunca foi muito forte. A desculpa dos óculos permanentemente embaciados não colhe. Existem detalhes, em filmes, que só os consigo apreender ao fim de uma meia dúzia de visões. Por isso, não me espantou nadinha que, após a revisão de Rio Bravo e a leitura deste texto completíssimo, eu tenha até hoje deixado escapar a subtil importância daquele contra-picado inicial, inserido nos melhores primeiros cinco minutos e oito segundos da história do cinema, ou os melhores cinco minutos e oito segundos da história do cinema tout court*. Um plano que a personagem de Dean Martin carrega sobre as costas quase até ao final da obra de Hawks, até ao momento em que recupera a sua dignidade. Rio Bravo é uma obra de uma extraodinária ressonância psicológica: foi certamente a pensar também nesse plano que JLG escreveu isto. E ainda há-de vir o dia em que, graças aos desígnios tecnológicos, Tarantino consiga colocar no mesmo filme o Ward Bond, o Walter Brennan e o Victor McLaglen.
* Por falar em Lições do Cinema, eu já telefonei à minha mamã para ela me enviar pelo correio azul a bata aos quadradinhos que eu usava na primária. Quero estar devidamente equipado para acompanhar as "lições" do mestre-escola, de batinha e cotovelos apoiados em cima da mesa com as mãos fechadas na cara. "Agora, meninos, vamos começar: primeiro agarra-se o barro assim...". Um paparazzi que persegue uma star: são temas quentinhos, directamente vindos do forno, da "actualidade". A Margarida Rebelo Pinto do cinema. E ainda se atreve a chamar "pesetero" ao Quique Flores.