Von Trier lança nova obra.
Munido de um capacete de mineiro, uns óculos de soldador, e um maçarico, lá me embrenhei na visão de Antichrist. Sentadinho num sofá, claro, porque eu tenho luz e tabaco para pagar, que me fazem muito mais falta que uma sessão de um filme pré-histórico na "magia da tela". Surge o nome da besta e o título do filme, anunciados com banda-sonora de trovão, para nos deixar bem claro que "isto é para criar ambiente medonho e soturno, ai jesus". Depois, os possivelmente cinco minutos mais ridículos da "história do cinema", que levariam Rivette a pedir desculpa, a beijar a mão e a pagar uma sardinhada a Pontecorvo. Diminuindo ainda mais o seu já escasso q.i, Von Trier porta-se como um atrasado mental encarregue de realizar um anúncio para um Linic. Oh meu deus, oh que belo que é, é a tragédia, é o horror, é o drama. Não deixa de ser cómico na sua azeiteira maneira de visualizar um desastre familiar (ah, aqueles floquinhos de neve, ah, o olhar em slow-slow-slow motion da criança, ah.). Um mimo. Depois, surge a táctica do enchimento, assaz usada por muito cabrão sem talento, que sem saber o que fazer e tendo medo do esqueleto da história, trata de a embebedar com imagens ora cheias de "beleza" ora repletas de "choque",e que possuem o bónus de passarem por filosofia e ensaio sobre a natureza humana, ui mãe, que os pardais necessitam de abundante milho para as suas análises. E lá vai passando o tempo, por entre fodas, punhetas, raposas mortas de fome, sessões de terapia, mais slow-motions de gajo que acabou de entrar no mercado do "audiovisual", mais fodas, um alicate ( isto faz o Miike ao pequeno-almoço, de olho tapado e enquanto come Chocapics), e a banda-sonora trovejante. E eu a ver isto tudo, e a perguntar-me qual a razão de tanto furor e polémica, e de tanta catalogação de filme-choque por esse mundo fora. Depois de coçar o queixo e iluminado pela luz do capacete, chegou-me ao cérebro a razão: a cara, o corpo, e a pintelheira da filha do Serge, uma gaja que faz parecer atraente um rato de esgoto, a raposa morta de fome ou mesmo o Willem Dafoe. É chocante, de facto. Um golpe de mestre do dinamarquês. Uma visão dantesca, como afirmam os repórteres da TVI por alturas de Agosto. Uma pessoa até suspira pelas mulheres do Botero. Santíssima trindade. Tudo isto é triste, tudo isto é Von Trier.